quinta-feira, 26 de junho de 2008

(Algumas) Coisas que me chateam:

Pessoas que mastigam ruidosamente
Pessoas que cheiram mal (ou usam perfumes daqueles tipo avó ou trésor da lojinha)
Pessoas que tratam mal animais (apetece-me espancá-las)
Pessoas que tratam mal outras pessoas (também me apetece espancá-las [a não ser que sejam só um bocadinho maltratadas e que mereçam mesmo])
Pessoas que passam a vida a dizer coisas evidentes e clichés
Pessoas que vão para o cinema comer pipocas, batatas fritas e beber sofregamente sumos (esta gente não janta?)
Pessoas sem vida própria que chafurdam no mal alheio
Pessoas amargas, azedas, carrancudas e eventualmente, narigudas
Pessoas que abandonam os seus velhos nos hospitais
Ficar com a pele pegajosa de tanto suar em dias de calor terrorista
Pessoas que me tocam quando passo por elas na rua ou se encostam quando claramente há muitíssimo espaço livre à sua volta (síndrome da praia do norte)
Pessoas que trabalham em sítios tipo bancos e segurança social e não dizem bom dia quando chegamos ao balcão
A ressaca do dia seguinte
Meninos e meninas mimalhos, mal educados que fazem birras terríveis e gato sapato dos pais
Pais que deixam os filhos chegar a esse estado de estupidez
Pessoas que destilam veneno, hipócritas, cínicas, canalhas
Pessoas que mentem descaradamente
Pessoas com a puta da mania
Não ter dinheiro para viajar e comprar montes de coisas que queria comprar
Sapatos que magoam os pés
Pedras no sapato
Pessoas que parecem pedras no sapato
E às vezes chateia-me terrivelmente que existam tantas coisas a chatearem-me

segunda-feira, 23 de junho de 2008

quarta-feira, 21 de maio de 2008

i carry your heart with me


i carry your heart with me (i carry it in
my heart) i am never without it (anywhere
i go you go,my dear; and whatever is done
by only me is your doing, my darling)
i fear
no fate (for you are my fate,my sweet) i want
no world (for beautiful you are my world, my true)
and it's you are whatever a moon has always meant
and whatever a sun will always sing is you

here is the deepest secret nobody knows
(here is the root of the root and the bud of the bud
and the sky of the sky of a tree called life; which grows
higher than the soul can hope or mind can hide)
and this is the wonder that's keeping the stars apart
i carry your heart(i carry it in my heart)


ee cummings

terça-feira, 13 de maio de 2008

Receita para fazer o azul

Se quiseres fazer azul,
pega num pedaço de céu e mete-o numa panela grande,
que possas levar ao lume do horizonte;
depois mexe o azul com um resto de vermelho da madrugada,
até que ele se desfaça;
despeja tudo num bacio bem limpo,
para que nada reste das impurezas da tarde.
Por fim, peneira um resto de ouro da areiado meio-dia,
até que a cor pegue ao fundo de metal.
Se quiseres, para que as cores se não desprendam com o tempo,
deita no líquido um caroço de pêssego queimado.
Vê-lo-ás desfazer-se, sem deixar sinais de que alguma vez ali o puseste;
e nem o negro da cinza deixará um resto de ocre na superfície dourada.
Podes, então, levantar a cor até à altura dos olhos,
e compará-la com o azul autêntico.
Ambas as cores te parecerão semelhantes,
sem que possas distinguir entre uma e outra.
Assim o fiz – eu, Abraão ben Judá Ibn Haim,iluminador de Loulé – e deixei a receita a quem quiser
algum dia, imitar o céu.

Nuno Júdice

Sempre adorei este texto. Lembro-me de quando o ouvi pela primeira vez no recital de poesia A Gula protagonizado pelo Sindicato de Poesia pela voz belíssima e inconfundível da Sofia Saldanha.
Também quero fazer azul. E expandir-me céu adentro.

quarta-feira, 7 de maio de 2008

Prefácio para um livro de poemas

Conheci um homem que possuía uma cabeça de vidro.
Víamos - pelo lado menos sombrio do pensamento - todo o sistema planetário.
Víamos o tremelicar da luz nas veias e o lodo das emoções na ponta dos dedos. O latejar do tempo na humidade dos lábios.
E a insónia, com seus aneis de lua quebradas e espermas ressequidos.
As estrelas mortas das cidades imaginadas.
Os ossos [tristes] das palavras.

A noite cerca a mão inteligente do homem que possui uma cabeça transparente.
Em redor dele chove.
Podemos imaginar uma chuva espessa, negra, plúmbea.
Depois, o homem abre a mão, uma laranja surge, esvoaça.
As cidades (como em todos os livros que li) ardem. Incêndios que destroem o último coração do sonho.
Mas aquele que se veste com a pele porosa da sua própria escrita olha, absorto, a laranja.
A queda da laranja provocará o poema?
A laranja voadora é, ou não é, uma laranja imaginada por um louco? E um louco, saberá o que é uma laranja?
E se a laranja cair? E o poema? E o poema com uma laranja a cair?
E o poema em forma de laranja?
E se eu comer a laranja, estarei a devorar o poema? A ficar louco?
[...]
E a palavra laranja existirá sem a laranja?
E a laranja voará sem a palavra laranja?
E se a laranja se iluminar a partir do seu centro, do seu gomo mais secreto, e alguém a [esquecer] no meio da noite - servirá [o brilho] da laranja para iluminar as cidades há muito mortas? E se a laranja se deslocar no espaço - mais depressa que o pensamento, e muito mais devagar que a laranja escrita - criará uma ordem ou um caos?

O homem que possui uma cabeça de vidro habita o lado de fora das muralhas da cidade.
Foi escorraçado.
[E] na deslocação das terras, noite dentro, vigia os seus próprios sonhos e pesadelos. Os seus próprios gestos - e um rosto suspenso na solidão.

Onde mora o homem que ousou escrever com a unha na sua alma, no seu sexo, no seu coração? E se escreveu laranja na alma, a alma ficará saborosa?
E se escreveu laranja no coração, a paixão impedi-lo-á de morrer?
E se escreveu laranja no sexo, o desejo aumentará?

Onde está a vida do homem que escreve, a vida da laranja, a vida do poema - a Vida, sem mais nada - estará aqui?
Fora das muralhas da cidade?
No interior do meu corpo? ou muito longe de mim - onde sei que possuo uma outra razão... e me suicido na tentativa de me transformar em poema e poder, enfim, circular livremente.



Al Berto in 'O Medo'

segunda-feira, 5 de maio de 2008

respirar

Mar que vem
Como vísceras enroladas na espuma
No cair da luz púrpura
Mar adentro pela garganta
Pelo tórax inteiro

Às vezes parece que sufoco